Por Vilson Wagner
Revista Informativo Ceriluz Além da Energia
Uma vaca de PVC em tamanho natural localizada em frente à casa denuncia: aquela é uma propriedade especializada na produção leiteira. O letreiro imitando a sua pelagem indica a quem ela pertence: à família Kriesmann. Alguns dos membros da comitiva da DEULA-Brasil tiram fotos ao lado do animal artificial. Enquanto uns apenas se escoram ou a abraçam, outros se inclinam e simulam uma ordenha manual, com as mãos pressionando o úbere em gestos simultâneos. Sistema que já ficou para trás, afinal, seria inviável ordenhar mais de mil animais desta maneira.
A propriedade está localizada na Alemanha, no Estado da Baixa Saxônia. Pertence a Jörn Kriesmann. A visita da comitiva brasileira – empresários, diretores de entidades, autoridades, professores etc – acontece dentro do Seminário Internacional sobre Qualificação Profissional na União Europeia (UE), promovido pela DEULA-Brasil e a DEULA-Nienburg entre os dias 10 e 20 de agosto, entidades que promovem intercâmbio internacional entre o Brasil e Alemanha há mais de 15 anos. Os membros do grupo terão a oportunidade de conhecer a propriedade de forma superficial. Mesmo assim, o que se vê impressiona! Imaginem então o que poderá aprender a estagiária brasileira Fabiane Niedermeyer, natural de Campinas das Missões, que chegou com a comitiva, mas não voltará com ela, pois permanecerá na propriedade durante o período de um ano, realizando estágio que servirá para a conclusão do seu curso universitário em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). “Vim com o objetivo de realizar um estágio direcionado a gestão da produção do leite e estou bastante otimista! O grande desafio nesta propriedade não é a clínica veterinária, mas sim, a questão da nutrição animal focando a produtividade”, comenta ela. Sua afirmação é baseada em pesquisas que realizou no site da empresa rural, na internet, antes mesmo de embarcar para a Alemanha.
As informações adiantadas pela estagiária são confirmadas pelo proprietário Jörn Kriesmann aos visitantes. Todo o trabalho visa à sanidade dos animais e o aumento da produtividade individual. Quando a produção por animal não alcança a média esperada ele é descartado. Atualmente são aproximadamente 1,1 mil vacas em ordenha, cada uma com uma produção média de 9,5 mil litros de leite ao ano, aproximadamente 28 litros ao dia, atingidos em três ordenhas diárias. “São dezoito horas de ordenha todos os dias, processo gerenciado por uma pessoa graças ao sistema rotatório, ou carrossel, que foi adotado”, explica o proprietário. Além da nutrição voltada ao aumento da produtividade por animal, a genética também vem sendo utilizada na propriedade com este objetivo. Para isso estão sendo feitos cruzamentos entre raças europeias. “O objetivo é buscar um animal mais robusto, um leite de maior qualidade, mantendo uma produção média aproximada a da raça original: a holandesa”, explica Kriesmann. O leite segue normas rígidas de qualidade e é vendido para duas empresas que o destinam à produção de iogurte e queijo. “Nossos estagiários podem acompanhar todo o negócio do leite, desde a produção ao gerenciamento”, garante Kriesmann.
A expectativa é ampliar o rebanho alcançando 1,6 mil vacas leiteiras. Contudo, para isso a família precisa ampliar sua infraestrutura de ordenha e encontrar uma forma de dar correto destino para os resíduos gerados, cuja propriedade de 650 hectares não suportará.
Entre as opções estão o arrendamento de áreas e, principalmente, a ampliação de seu parque de biodigestores utilizados para gerar energia elétrica, cujas obras já começaram. A propriedade concilia de forma harmônica a pecuária de leite e a geração de energia elétrica, por meio do biogás e também de torres eólicas. Com a crise da energia nuclear na Europa e na Ásia o governo passou a estimular a geração de energias alternativas e por isso o biogás se tornou uma excelente oportunidade. Conforme destaca Kriesmann, atualmente o melhor negócio da família é justamente a produção de energia com base na biomassa, porém, ela depende diretamente da pecuária, uma vez que o esterco gerado pelos animais é utilizado como combustível para a produção do biogás, que após é convertido em eletricidade. Junto ao esterco é misturada ainda silagem de milho, a mesma que é utilizada como alimentação para as vacas. Atualmente são produzidos na propriedade dos Kriesmann 8,5 milhões de quilowatts (kW) em seus três biodigestores, o que é suficiente para abastecer de 2,5 mil a 3 mil casas. Esta energia está sendo comercializada no mercado a um preço de E$ 0,20 centavos o kW, preço garantido pelo prazo de 10 anos pelo governo e, segundo o produtor, bastante positivo, suprindo o investimento de quatro milhões de Euros feitos na atual estrutura com capacidade de 1 Megawatts (MW). O resultado disso, no entanto, é o aumento da monocultura do milho nas propriedades rurais alemãs, voltadas à alimentação dos biodigestores. O próprio Kriesmann irá aumentar sua estrutura de geração, incrementando outro biodigestor com capacidade para 500 kW.
As duas atividades completam um ciclo. Enquanto que os biodigestores se alimentam dos resíduos gerados pelas vacas, as sobras orgânicas dos biodigestores são novamente aproveitadas pelos animais: depois de seco pelo calor do gerador de energia o rejeito dos biodigestores é moído e misturado a cal, sendo utilizado como cama para as vacas. Esta receita elaborada na propriedade tem o objetivo de reduzir os casos de mastite nos animais. E vem dando certo! A cama é desfeita a cada dois dias recebendo novo composto, não contaminado. O aproveitamento deste resíduo tem ainda uma compensação financeira, uma vez que o produtor acaba recebendo E$ 0,03 centavos a mais por cada kW gerados.
Assim a propriedade se torna 100% sustentável, dando o correto destino aos rejeitos e alcançando excelentes resultados econômicos. Esta é a agricultura moderna cujo exemplo vem da Alemanha. A ordenha manual ficou no passado e assimilou novas tendências. A agricultura do futuro concilia tecnologia, produtividade e sustentabilidade!